Morreu um homem.
Desde que esse homem morreu, por entre epitáfios vários e justificadíssimas homenagens recordando-lhe a carreira e os méritos, não faltou a asinina referência ao facto de ele ter sido toda a vida um fumador inveterado. O que significaria, evidentemente, que aquele homem morreu por causa do tabaco. Coitadinho, portanto. E "é bem feita", presume-se, pensarão alguns.
Vejamos.
Nasceu em 26 de Janeiro de 1925 e faleceu no passado dia 26 de Setembro. Ou seja, esteve vivo durante 83 anos, faltando-lhe apenas 4 meses para ter chegado aos 84.
Isto representa 1.002 meses ou 4.366 semanas. Enfim, foram exactamente 30.559 dias de uma vida bem preenchida e também, sim, cheia de belas fumaças.
As alminhas que se dizem caridosas pretenderiam por certo que, se o desgraçado tivesse largado o vício, algures no seu passado, por certo chegaria aos 100, aos 110 anos, se calhar mais ainda.
Não há paciência. Deixem-no em paz, caramba!
Ao menos desta vez, houve alguém que viveu bem e muito; morreu de velho, com dignidade. Nada de mais simples e de mais natural.
Ao menos desta vez, o tabaco não teve nada a ver com as leis da Natureza, com a vontade de Deus, com o destino de cada qual.
A não ser que inventem a cura para a morte, a não ser que descubram a fonte da eterna juventude, ao menos desta vez larguem este cadáver, ao menos este, de alguém que está mais vivo do que nunca.
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